Reciclagem: demanda e preço podem elevar taxa no país
Avanço na reciclagem impõe necessidade de enfrentar a falta estruturação na cadeia de logística reversa, principalmente no pós-consumo
Se há demanda pelo material, ele alcançará bom preço e será reciclado. Ainda falta estruturação na cadeia de logística reversa, principalmente pós-consumo, mas surgem caminhos para aumentar o índice brasileiro de reciclagem, há anos estacionado na casa dos 5%. O exemplo de maior sucesso é o das latinhas de alumínio, cujo índice de reciclagem bate nos 100%. Já o vidro chega apenas a 25% de reciclagem, de acordo com a Associação Brasileira das Indústrias de Vidro (Abividro).
A entidade leva em consideração no cálculo o total fabricado no país e as embalagens pós consumo compradas pela indústria, contrapondo o índice divulgado pelo governo, de 11% de reciclagem, que considera o total de vidro consumido no país, incluindo produtos importados que chegam embalados. A lista de entraves ao aumento da reciclagem do vidro inclui a fragilidade do material, que quebra, causando acidentes, além do problema do peso, que dificulta o transporte e, claro, vale pouco, embora seja 100% reciclável. Ao contrário do plástico e do papel, que perdem qualidades físicas quando reciclados muitas vezes, o vidro mantém as propriedades.
“A matéria-prima para a fabricação do vidro é a areia, barata; já a bauxita, a base do alumínio, é extraída da crosta terrestre em processos complicados e caros, portanto, reciclar alumínio vale mais a pena”, analisa Rodrigo Oliveira, CEO da GreenMining, que desde 2018 atua na logística reversa de embalagens pós-consumo. Até hoje coletou e destinou à reciclagem 7,9 milhões de quilos de materiais, evitando 1,3 milhões de quilos de CO2.
Nas Estações Preço de Fábrica, a empresa compra materiais dos catadores de recicláveis pagando preços maiores do que os praticados por sucateiros. No modelo de negócio, a logística reversa (LR) é custeada pelo fabricante, como determina a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), de 2010.
“A PNRS prevê 30% de LR, estamos em 5% de índice de reciclagem (com produção de 80 milhões de toneladas de resíduos). A meta para 2040 será 50%. Avançamos aos poucos, com novas regulações e mais conscientização da sociedade. Em 2021, quando inauguramos a unidade de Carapicuíba, fizemos uma pesquisa com 25 catadores e 24 não trabalhavam com vidro. Apenas uma catadora lidava com o material, recebendo R$ 0,06 pelo quilo. Nós chegamos pagando de R$ 0,30 a R$ 0,60. Hoje, 400 pessoas entregam vidro ali. É uma vitória”, avalia Oliveira.
A Owens-Illinois (O-I), presente em 19 países e entre as gigantes na fabricação de embalagens de vidro, tem procurado promover a LR do material pós-consumo. Segundo Alexandre Macário, gerente do departamento de economia circular da O-I, a meta da companhia é atingir 50% de uso de cacos como matéria-prima para a produção de novas embalagens até 2030.
Entre os avanços, a empresa instalou, em parceria com a Heineken e o Grupo Seiva, 143 máquinas trituradoras de vidro em bares e restaurantes de São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Recife, para facilitar o armazenamento e transporte dos cacos até as fábricas. O plano é ampliar para 763 máquinas até 2025 e coletar 115 mil toneladas de vidro, permitindo a redução de 61 mil toneladas de CO2 em cinco anos. “Cada tonelada de vidro reciclado evita a extração de 1,2 tonelada de matérias-primas virgens, como areia, calcário e barrilha”, diz Macário.
“O foco precisa estar no preço do reciclável e na estruturação da cadeia de LR”, aponta a professora Roberta de Castro Souza Pião, da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (Poli-USP). “Porém, o alto grau de informalidade na área torna tudo mais complicado.” Para resolver o problema, ela afirma que é preciso avançar na questão tributária. “Há bitributação: o agente econômico paga imposto pelo material original e também pelo reciclado. Isso desincentiva o uso de materiais reciclados no processo produtivo”, diz.