Mineração verde precisa de engenheiros, designers de algoritmo e especialistas em carbono e clima
Empresas do setor da mineração apostam na tecnologia para se adaptar às novas demandas e cuidados trazidos pela economia verde
Com novos critérios regulatórios e um investimento pesado em novas tecnologias, o mercado de mineração tem apostado na inovação para aumentar a produtividade, causando o menor impacto possível no meio ambiente e contribuindo para a criação de produtos essenciais para uma nova economia verde. O setor vê um crescimento muito forte na demanda por minerais como lítio, alumínio e cobre, para produção de baterias e painéis solares, por exemplo.
Se antes o setor era dominado por engenheiros e técnicos das mais diversas áreas, hoje há espaço também para profissionais como analistas de mudanças climáticas ou especialistas de mercado de carbono.
“Esse mix de conhecimentos é o que se incentiva dentro da companhia”, afirma Rodrigo Lauria, diretor de mudanças climáticas da Vale. Segundo ele, além de a economia verde abrir novas posições para profissionais especializados, há uma demanda do mercado por profissionais multidisciplinares.
A ideia é que essas pessoas adaptem seus conhecimentos especializados a esta nova lógica de mercado, entendendo, por exemplo, de aspectos regulatórios do setor, enquanto também são capazes de lidar bem com tecnologia, cada vez mais presente no dia a dia da mineração.
“Atualmente, o setor está passando por uma transição de tecnologia forte”, diz Julio Nery, diretor de sustentabilidade do Ibram (Instituto Brasileiro de Mineração), que representa empresas do setor. “Procura-se por um profissional que seja mais adaptado a esse perfil tecnológico”, afirma, ao citar a relevância cada vez maior de ferramentas digitais no dia a dia do setor.
Nery pontua que o gerenciamento de rejeitos da mineração é quase todo controlado de forma remota, por exemplo, e habilidades para lidar com esses sistemas é essencial para quem deseja trabalhar na área. A demanda, segundo ele, se aplica tanto ao engenheiro e analista, quanto ao próprio operário. “O motorista de caminhão, que antes estava atrás do volante, hoje está guiando com um joystick”, afirma.
Segundo eles, parte desse avanço tecnológico se deu na esteira de novas regulações que foram definidas após os recentes desastres envolvendo empresas do setor, como as tragédias em Mariana e Brumadinho, ambas em Minas Gerais.
“O avanço tecnológico vem para garantir que a extração dos minérios ocorra de forma mais limpa. Não se trata de não explorar, mas sim de como explorar. Temos que ser mais inteligentes com nossos recursos naturais”. Diz Onara Lima, especialista em sustentabilidade e gestão ambiental.
A própria reputação da mineração é uma preocupação de agentes da área, que buscam mostrar ao público o avanço das técnicas usadas no setor. “Quando você tem desastres como esses que aconteceram, a gente vê uma retração do interesse do jovem para trabalhar na mineração”, afirma Nery. “Temos que mostrar que acidentes acontecem, mas trabalhar para que eles não aconteçam. Para que esse potencial de risco não se realize”, complementa.
Essa desconfiança do público com o papel das empresas pode ser vista em números. Segundo pesquisa financiada pela 3M sobre as percepções do público brasileiro sobre “empregos verdes”, apesar de 88% dos entrevistados afirmarem que esperam que essas posições cresçam nos próximos cinco anos, 57% dizem que as empresas não estão equipadas para fazer escolhas que promovam a sustentabilidade.
Profissionais devem ir além da formação
Com a velocidade das mudanças tecnológicas, vem se tornando cada vez mais difícil para os profissionais buscarem somente uma formação que contemple todas as habilidades necessárias para se destacar no mercado de trabalho.
Para Lauria, é fundamental que os profissionais busquem ressignificar suas formações e não deixem de estudar. “Você não vai conseguir achar tudo numa formação tradicional, mas há uma série de formações extras”, afirma o diretor da Vale.
Para ele, além de buscar uma formação que contemple disciplinas de sustentabilidade e aspectos regulatórios, é fundamental continuar buscando conhecimento no decorrer da carreira e saber conectá-los com sua área de atuação.
“Como é que insiro a engenharia dentro do universo do carbono e como isso se conecta com meu custo reduzido no futuro? Que impactos posso ter com as regulações que estão sendo discutidas na Europa, por exemplo? Essa capacidade de adaptação e conexão é algo que ajuda a formar esse novo profissional”, diz Rodrigo Lauria, diretor de mudanças climáticas da Vale.
Nery destaca também a necessidade de expandir essas habilidades para profissionais de nível técnico. Ele diz que cerca de 90% das vagas no setor são para esses profissionais e que aspectos de automatização e gerenciamento de sistemas tecnológicos já fazem parte do dia a dia do trabalho nas minas. “A formação tem que ser muito mais avançada do que existia antes”, afirma.
Setor demanda engenheiros, analistas e profissionais ligados a tecnologia
Segundo especialistas, a demanda por engenheiros e profissionais técnicos deve continuar alta, tendo em vista o crescimento do setor. Isso abre oportunidade para profissionais com diferentes especializações como:
- Engenheiros Eletricistas;
● Engenheiros Mecânicos;
● Engenheiros de Minas;
● Engenheiros Ambientais;
● Engenheiros de Produção;
● Geólogos;
● Geotécnicos.
Para Leandro Oliveira, coordenador de Desenho Organizacional e RH Analytics da mineradora Anglo American no Brasil, alguns cargos específicos do setor de tecnologia também começam a ser demandados pelo setor, dentre eles:
- Operadores de Equipamentos Remotos,
● Técnicos de Drones;
● Mecânicos de Robótica;
● Técnicos de IoT (internet das coisas);
● Designer de Algoritmos.
Enquanto os mecânicos de robótica podem contribuir para os ajustes em equipamentos que fazem manutenção e inspeção nas minas, por exemplo, os técnicos de IoT certificam que todas essas ferramentas se comuniquem apropriadamente com a internet, recebendo dos servidores comandos enviados à distância e armazenando dados. Além disso, os designers de algoritmo ficam responsáveis pela programação e implementação de comandos que automatizam tarefas.
“Essas novas funções buscam incorporar os avanços tecnológicos dos últimos anos como já foi feito por outras indústrias, como óleo e gás e agropecuária”, afirma Oliveira. “Além disso, oferecem maior segurança ao reduzir a exposição das pessoas aos ambientes com potencial de risco da atividade mineradora”, complementa.
No que se refere a cargos mais analíticos, alguns profissionais também devem ser requisitados, como:
- Analistas de Mudanças Climáticas;
● Especialistas em Mercado de Carbono;
● Economistas;
● Administradores.
De acordo com Nery, a demanda por profissionais ligados a áreas ambientais e sociais também tem crescido consideravelmente, assim como os esforços das companhias para incluir esses profissionais dentro de seus processos.
Já os salários praticados no setor podem variar conforme a empresa contratante e o nível de senioridade e especialização de cada profissional. Segundo o guia salarial publicado anualmente pela consultoria Robert Half, um Engenheiro de Produção, por exemplo, pode ganhar de R$ 6,2 mil mensais, em uma vaga de nível júnior em uma empresa de pequeno e médio porte, a até R$ 13,3 mil mensais, em nível sênior em uma grande empresa.
Seguindo esta mesma lógica, o salário de um Engenheiro de ESG, por exemplo, pode variar de R$ 8,6 mil a R$ 19,3 mil. Os dados dizem respeito a empresas que trabalham no ramo de engenharia, sem estarem ligadas, necessariamente, à mineração.
Questionadas pela reportagem, nenhuma das companhias consultadas revelou os salários médios pagos a seus funcionários, alegando, em sua maioria, se tratarem de dados estratégicos para seus negócios.