Embrapa avalia criar ‘Lei Rouanet’ do agro para investimento em pesquisas
‘Lei Rouanet’ do agro foi uma das sugestões feitas por grupo de estudo à direção da empresa pública
Para encontrar fontes que deem sustentabilidade financeira e evitem incertezas orçamentárias recorrentes, como a que ocorre atualmente, a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) terá de inovar em 2024. Uma das alternativas avaliadas é a criação de uma “Lei Rouanet” do agro, para captar recursos privados para financiar as descobertas científicas da estatal.
Esse foi um dos apontamentos feitos no relatório final do Grupo de Estudos Avançados de Aprimoramento do Sistema Nacional de Pesquisa Agropecuária, apresentado neste mês à presidente da Embrapa, Silvia Massruhá. O documento foi criticado por integrantes da gestão anterior da estatal.
A proposta é criar o Programa Nacional de Incentivo à Pesquisa Agropecuária (PNIPA), aos moldes da conhecida Lei Rouanet de incentivo à cultura. A ideia é instituir um instrumento para captar e canalizar recursos privados para investimentos em pesquisa agro. Os contribuintes que destinarem verbas para esse tipo de projeto poderiam deduzir os repasses do Imposto de Renda, em forma de doações e patrocínios.
“Precisamos sair dos modelos tradicionais e dar tranquilidade para a Embrapa trabalhar. Todos os anos é uma batalha para a empresa cumprir seus compromissos, pois nunca sabemos quanto da estimativa orçamentária vai estar disponível”, afirmou Massruhá à reportagem.
Outra sugestão para engordar o caixa com recursos privados nos próximos anos seria criar uma taxa sobre a exportação de produtos que seria destinada a pesquisas. O GT ressaltou que a ideia é complexa e de “dificílima” execução. Esse tipo de taxação enfrenta forte resistência do setor.
“Precisamos inverter o jogo e pensar fora da caixa, com uma estratégia mais sustentável para que a empresa não fique tão apreensiva”, disse a presidente.
O GT sugeriu destinar parte dos recursos dos Fundos para Assistência Técnica, Educacional e Social (Fates), composto por 5% do faturamento bruto das cooperativas, agropecuárias ou não, para financiar a pesquisa. O sistema “S” também poderia contribuir.
Outra possibilidade é trabalhar com os chamados “check-offs”. Usado nos Estados Unidos, o mecanismo permite a negociação direta com as cadeias produtivas específicas, como soja, milho e algodão, para estabelecer um percentual sobre o valor da produção desses itens a ser destinado ao financiamento da pesquisa.
Parcerias público-privadas
A definição das novas fontes de financiamento deve direcionar possíveis mudanças na natureza jurídica da estatal. O relatório do GT indicou propostas de alterações na estrutura e gestão, como a transformação da Embrapa em uma fundação. Massruhá acredita que o modelo atual, de empresa pública de direito privado, ainda pode ser mais bem explorado para atrair e gerenciar recursos da iniciativa privada para a pesquisa.
Uma das apostas para melhorar as parcerias público-privadas no agro é a criação do Núcleo de Inovação Tecnológica (NIT). Ele funcionará como um braço de negócios da Embrapa, para gerir os acordos de desenvolvimento tecnológico com a iniciativa privada. Nesse modelo, há ainda a figura de uma terceira via, como uma fundação selecionada pela estatal, que administrará a aplicação dos recursos.
Um piloto do NIT deve ser posto em prática nos próximos meses com unidades descentralizadas que recolhem mais de R$ 1 milhão por ano em royalties de tecnologias já desenvolvidas. Atualmente, a Embrapa recebe cerca de R$ 60 milhões de royalties por ano, valor considerado “muito baixo”, por Massruhá.
Os valores não são “carimbados”. Vão para o caixa geral da União e não são obrigatoriamente redirecionados para a pesquisa agropecuária.
Com o NIT, a expectativa é negociar porcentagens maiores de participação da estatal nos lucros dessas tecnologias. Os recursos entrariam no caixa da Embrapa e retroalimentariam a pesquisa. “A empresa precisa ser mais ágil pois trabalha com criatividade e risco. O NIT é algo que pode trazer diferencial na parceria público privada”, disse.
As parcerias público-privadas respondem por 25% dos 1.125 projetos da Embrapa, mas geram retorno financeiro ainda pequeno. “A captação de recursos é, em média, de apenas 5% dos projetos”, ponderou Massruhá. “Temos que melhorar esse modelo de negócio para ser um ganha-ganha”.
O ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, sugeriu a criação de um mecanismo para repartir parte dos royalties entre os empregados da estatal, como forma de estimular a inovação e a pesquisa. “Podemos pensar em um modelo para que possa ratear entre todos os colaboradores um pouco dos royalties que a Embrapa venha a desenvolver da propriedade intelectual”, indicou.
Outra possibilidade listada no relatório é a utilização de Organizações Sociais (OS), que atuariam com contratos de gestão com a Embrapa. Essa ferramenta pode ser usada para canalizar os recursos captados, por exemplo, com a “Lei Rouanet da pesquisa agropecuária” e de parcerias com empresas privadas firmadas pelo NIT.
Com mais fontes de recursos privados, a Embrapa quer focar os recursos públicos do orçamento da União em pesquisas que não estão no radar imediato do mercado, como tecnologias para a agricultura familiar e outros temas de “longo prazo”, salientou Massruhá.
Haverá mudanças também no modelo de gestão. Seis grupos de trabalho vão apresentar seus resultados ainda neste mês sobre as indicações para desburocratizar processos, descentralizar as tomadas de decisões e melhorar a política de recursos humanos da estatal.