Mesmo com desafios, setor do aço está otimista -No último dia do Congresso do Aço Brasil 2022, o futuro da atividade econômica foi debatido pelos executivos
Apesar do cenário volátil e desafiador, representantes da indústria siderúrgica nacional enxergam boas perspectivas para o setor, tanto no fechamento de 2022 quanto no decorrer dos próximos anos. Para o futuro, no entanto, alertam para a necessidade de medidas relativas à competitividade, incluindo a redução do custo Brasil e um maior protecionismo em relação ao mercado externo.
Uma produção mais sustentável em vistas de contribuir para as metas de descarbonização do planeta também é imprescindível, porém, desafiadora e requer investimentos vultuosos por parte das companhias e políticas públicas que viabilizem as ações.
Estes e outros temas foram abordados no painel de encerramento do Congresso do Aço Brasil 2022, que reuniu os CEOs de algumas das principais siderúrgicas brasileiras para discutirem temas caros ao futuro do setor. Desenvolvimento econômico e de mercado, competitividade, cenário internacional, sustentabilidade e mudanças climáticas estiveram entre os pontos abordados pelos executivos.
O presidente Executivo do Instituto Aço Brasil, Marco Polo de Mello Lopes, moderou o debate e apresentou números da indústria do aço mostrando a evolução da atividade nos últimos anos e projetando avanços para os próximos. Como o aumento do consumo por habitante no País, como trouxe o DIÁRIO DO COMÉRCIO na última edição. A expectativa da entidade é que o consumo, hoje em cerca de 125 quilos por habitante dobre na próxima década, alcançando a média global da ordem de 250 quilos por habitante.
Participaram do painel o diretor-presidente e CEO da Gerdau, Gustavo Werneck; o presidente do Board Usiminas, Sergio Leite; o presidente da Companhia Siderúrgica do Pecém, Marcelo Botelho; todos os conselheiros do Instituto Aço Brasil. E o presidente do Conselho Diretor da entidade e presidente da ArcelorMittal Brasil, CEO Longos e Mineração Latam, Jefferson de Paula.
Em suma, todos falaram das boas perspectivas de suas empresas para o corrente ano, apesar do cenário desafiador, bem como indicaram confiança e boas apostas para o futuro no que se refere ao desempenho econômico do País e o consequente aumento do consumo de aço por habitante. Também ressaltam as preocupações e as ações que vêm sendo desenvolvidas em vistas de amenizar os impactos do custo Brasil na produção e na competitividade do setor, tendo à frente o Instituto Aço Brasil e a Coalizão Indústria.
Sobre o mercado internacional, frisaram que não se opõem ao livre comércio, mas que se preocupam com a competição desleal vinda, sobretudo, da China. Sobre a sustentabilidade do setor, reforçaram o compromisso da indústria siderúrgica para com os compromissos firmados pelo Brasil para a descarbonização do planeta até 2050, mas alertaram que apenas os recursos e esforços das companhias não serão suficientes para concretizar essa corrida.
O DIÁRIO DO COMÉRCIO acompanhou o debate e lista, a seguir, parte dos posicionamentos dos executivos acerca dos temas propostos pelo presidente executivo do Aço Brasil.
CENÁRIO 2022
“Assim como no fim do ano passado, 2022 também tem sido marcado por bastante volatilidade e incertezas, mas será um ano bom. Vínhamos de um cenário de pandemia e somou-se a guerra, impondo mais um fator de instabilidade, o que fez os preços das matérias-primas explodirem. Agora os preços das commodities estão baixando, o que causa mais volatilidade. O mundo tem ciclos e o Brasil também. Mas teremos bons resultados que apenas não serão melhores que os de 2021, porque aqueles foram extraordinários” – Jefferson De Paula –
“O Brasil atravessa um bom momento em termos de economia e a expectativa para o crescimento do PIB aumenta a cada semana, indicando que estamos avançando. São grandes as expectativas para os próximos anos e décadas, em função de tudo o que acontece no País e no mundo. Vamos tem em 2022 um dos melhores três ou quatro anos da década” – Sergio Leite
“Nossa visão é muito otimista para o setor olhando os próximos dez anos comparados aos últimos dez. O varejo talvez enfrente mais dificuldade dado o contexto econômico doméstico, mas outros como construção e indústria automotiva estão bastante demandantes. A Gerdau deverá fechar o ano com entregas bastantes parecidas com o que apurou em 2021” – Gustavo Werneck
“Estou muito esperançoso com o Brasil. Vejo que estamos no caminho certo. A CSP produz semiacabados, uma indústria muito cíclica e as visões de curto e longo prazos precisam estar sempre balizadas. A empresa sofre muito mais com as oscilações do mercado e há necessidade de se reinventar e estar sempre tecnologicamente e gerencialmente na vanguarda. O ano de 2021 foi muito bom e 2022 será o segundo melhor ano da história da empresa” – Marcelo Botelho
DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO E DE MERCADO
“O aumento do consumo de aço por habitante é um sonho antigo do setor. O Brasil talvez seja o único país que ficou estagnado nos últimos anos, justamente porque nas últimas décadas apresentou crescimento econômico baixo. Precisamos fazer com que o PIB cresça daqui para frente e que haja investimentos em infraestrutura, o que levará ao aumento do consumo do aço. A construção civil é outra alavanca e temos um déficit importante no País. Por último, o setor automotivo tem potencial para se tornar um polo exportador” – Sergio Leite
“O indicador de consumo de aço por habitante é acompanhado pela ONU porque está diretamente relacionado ao desempenho econômico dos países. Dobrar é uma meta arrojada. Ano passado foi um ano atípico. Precisamos de políticas públicas para alcançar esses números” – Gustavo Werneck
“Estou otimista, mas precisamos de políticas públicas que incentivem a industrialização do Brasil, como a renovação de frota. A indústria do aço está preparada para agir e ajudar o Brasil a tornar-se uma potência mais industrializada. A siderurgia está fazendo seu papel, investindo e mantendo seu parque atualizado. Isso nos dá credencial para aspirar esses números” – Marcelo Botelho
“Esses números me motivam muito. Nós sabemos o que fazer e como trabalhar para fazer esse país crescer fortemente nos próximos dez anos. Precisamos discutir com o Congresso, com o governo e a sociedade – Jefferson De Paula
COMPETITIVIDADE E CUSTO BRASIL
“Já identificamos parte do problema que afeta a competitividade brasileira e agora é hora de colocar em prática o plano de ação. Se tivermos capacidade de executá-lo nos próximos quatro anos, daremos passos largos. Iniciamos o diálogo com o governo sobre abertura comercial, não podemos concorrer em condições assimétricas” – Gustavo Werneck
“O Brasil tem melhorado muito. O modelo mental do atual governo vai nessa direção de reduzir a carga do Estado, o que é importante, pois um estado inibe investimentos e atividades. Isso é um círculo vicioso e hoje estamos vivendo um virtuoso. O fato de estar no discurso e debate geral é o primeiro passo para endereçar o custo estrutural. Precisamos de desburocratização e simplificação” – Marcelo Botelho
“Para resolvermos um problema, primeiro temos que conhecê-lo. Sempre falamos em custo Brasil e agora que o conhecemos precisamos da execução. E o Instituto Aço Brasil tem que participar ativamente deste processo. A título de comparação, nas operações da Arcelor nos Estados Unidos enquanto preciso de um advogado, aqui no Brasil são 26, dada a burocracia. Em termos de infraestrutura, enquanto o custo logístico de Minas para o Nordeste gira em torno de US$ 100 por tonelada, o chinês consegue trazer aço para o Brasil a US$ 20 a tonelada” – Jefferson De Paula
“Temos três pontos importantes na competitividade: logística e infraestrutura, que já estamos dando passos significativos; tributário, que precisa ser trabalhado a partir das reformas administrativas e tributária; e o fator humano, que é a capacitação permanente das pessoas. Trabalhando nessas três frentes conseguiremos solucionar parte do custo Brasil e avançar na competitividade” – Sergio Leite
MERCADO INTERNACIONAL
“O plano plurianual estratégico chinês gerou sobrecapacidade; o domínio asiático não aconteceu por acaso. E é um perigo o Brasil não ter medidas de salvaguarda. Não acho que seja a solução para o Brasil, mas não podemos destruir a indústria sem o cuidado devido” – Marcelo Botelho
“Se a China tem uma capacidade monstruosa e a União Europeia e os Estados Unidos se fecham com medidas protecionistas, sendo dois grandes mercados, para onde vai o Brasil? Sou a favor de livre comércio, mas não podemos ser inocentes de abrir o País e todos os outros terem medidas comerciais” – Jefferson De Paula
“No Brasil criamos mecanismos para proteção da indústria internacional. Existe um risco para o País. É preciso criar mecanismos, inclusive de conteúdo local, analisando o modelo mais adequado à realidade do cenário econômico e de comércio a nível mundial. Somos todos liberais, mas será que faz sentido sermos liberais em termos econômicos em um mundo protecionista?” – Sergio Leite
“Cada vez mais encontramos dificuldades para exportar. A indústria brasileira do aço é extremamente competitiva quando comparada com qualquer outra mundial, mas vai agregando os pontos do custo Brasil. Há ativos parados hoje no País que poderiam estar produzindo e gerando emprego, mas esbarram nestas lacunas” – Gustavo Werneck
SUSTENTABILIDADE E MUDANÇAS CLIMÁTICAS
“É um caminho sem volta e vamos ter que trabalhar fortemente porque o mundo necessita disso. Temos um desafio e grande responsabilidade com o futuro do planeta. O assunto é fundamental para a siderurgia mundial e brasileira e o Brasil tem vantagens competitivas fortes em relação à Europa e Estados Unidos. O grupo Arcelor já investiu 300 milhões de euros para estudar e desenvolver novas tecnologias para a produção. Acreditamos que até 2030 será aos poucos e daí para frente com melhorias destrutivas. Por isso, estimamos investimentos de US$ 10 bilhões até 2030 para reduzir as emissões em 25%. E temos um fundo de desenvolvimento com 500 milhões de euros promover startups e processos para uma produção verde de aço” – Jefferson De Paula
“É um desafio para a indústria e para o planeta nos próximos anos. A descarbonização da indústria do aço vai requerer importantes investimentos e incentivos por parte dos governos para que se possa avançar. A Usiminas está trabalhando intensamente no tema. Estão sendo feitos investimentos no desenvolvimento de tecnologias, mas é preciso estudar a viabilidade econômica. Temos trabalhado muito no aumento da sucata e na substituição do carvão” – Sergio Leite
“Minhas principais preocupações estão nas metas e prazos a serem atingidos. Até aqui o setor industrial e do aço pagaram boa parte de uma conta que não era nossa. E os números mostram que a siderurgia nacional responde por 0,15% do carbono global. Eu não gostaria de pagar outra conta que não é nossa. Me preocupa, porque considerando US$ 40 por tonelada para a descarbonização, em 30 anos teremos um custo anual para o setor de US$ 7 bilhões. A conta não fecha. O balanço das empresas não paga isso” – Gustavo Werneck
“Este é um dos maiores desafios dos pilares ESG que a indústria do aço tem que enfrentar, porque é estrutural. Olhando esse desafio me chama atenção o DNA da indústria do aço brasileiro. A gente move muitos insumos pelo mundo. Minério estamos próximos e temos vantagens, mas e o carvão? Este é um dos elementos para os quais temos que achar uma solução” – Marcelo Botelho